Descoberto o filão, Hollywood não pára. As “sagas”, as “sequelas” ou as intermináveis “séries” em torno de um herói ou vilão são quase sempre sinónimo de êxito de bilheteira, enchendo os cofres das majors; afinal, o seu primeiro e principal objectivo. Por isso, passada a fase essencial e mais convincente do primeiro filme, leia-se primeiro e estrondoso grande impacto mediático, as grandes produtoras apostam sobretudo na repetição da fórmula, explorando igualmente um importante manancial: o “merchandising”. Enquanto for de algum sucesso a estafada estratégia, teremos um sem número de filmes que só aparentemente cumprem um fio de continuidade sobre um título que fez furor entre o grande público do cinema.
Batman foi recuperado nos anos 90 por Tim Burton, que realizou com originalidade e sucesso (comercial e artístico) os dois primeiros filmes desta série (o primeiro ainda em 1989 sob o simples título de “Batman” para logo depois apresentar a sequela “Batman Regressa”) que se inspirava directamente numa das figuras da Banda Desenhada mais populares em todo o mundo. Depois do êxito do Super-Homem nos anos 80, a cinematografia do final do século viu em Batman e, logo depois, no Homem-Aranha os herdeiros de uma tradição que nos Estados Unidos e no seu modelo cultural de exportação global alcançou uma extraordinária popularidade.
Acontece que depois da magnífica abordagem de Tim Burton, o “Cavaleiro das Trevas” tem sido muito mal tratado, com a realização do terceiro e quarto filmes (“Batman para Sempre” e “Batman & Robin”) a ser assegurada pelo estridente Joel Schumacher. Todavia, daí resultaria essencialmente um fiasco barulhento, mas de êxito garantido ao nível de receitas, pois não podemos esquecer a máquina gigantesca que desde o início promove esta série. Oito anos depois do último “Batman”, Christopher Nolan (realizador de culto que nos deu “Memento” e “Insónia”) foi chamado para realizar “Batman – O Início”, o quinto filme da série que procura aprofundar num registo realista o passado e, em especial, a infância de Bruce Wayne/Batman. Desse modo, Nolan pega no modelo freudiano do trauma de infância e procura justificar a escolha de Batman, bem como toda a sua determinação em lutar pelo bem, contra o mal. Acontece que, apesar de nos dar algumas cenas óbvias mas bem montadas, como aquela em que percebemos que Bruce Wayne tivera uma terrífica experiência de medo com os morcegos que lhe inspirariam a acção futura, Christopher Nolan peca por abordar o tema sem grande convicção, chama ou entusiasmo. E o que fica é um esforço inglório para desvendar o que já de alguma forma sabíamos ou adivinhávamos desde o primeiro filme de Tim Burton. Perscrutar a infância de Wayne não contribuiu em quase nada para a ampliação do mito de Batman. Antes pelo contrário, parece promover apenas uma sensaborona imagem de que as forças do nosso herói têm origem numa obscura e mal explicada relação com os morcegos. Explorar os fantasmas do passado, mesmo que de um personagem, pode assim redundar num imenso erro de estratégia sobre a hipótese de melhor compreendermos o que nos rodeia. Desta vez, saber da génese, isto é, do início de Batman só prejudicou a construção do mito que em torno dele se estabeleceu ao longo de décadas de Banda Desenhada, Literatura e Cinema.
“Batman – O Início” (EUA, 2004) **
Realização: Christopher Nolan
Actores principais: Christian Bale, Michael Caine e Katie Holmes