2000 Estética, vanguarda e utopia do idealismo à tradição do novo

Estética, vanguarda e utopia

 

A “estética idealista” e a “autonomia da arte”

 

A beleza é a única expressão possível da liberdade no mundo dos fenómenos.

Schiller

 

Entre 1750 e 1758, a “esperança malograda” contida na Aesthetica de Baumgarten compreendia a estratégia essencial, segundo mais tarde Kant viria a sintetizar, de “submeter a princípios racionais o julgamento do belo”[1] e, consequentemente, elevar a “estética”[2] ao estatuto de uma ciência ou filosofia da arte, buscando uma teorização própria e autónoma sobre a síntese dialéctica de dois opostos: a razão e a sensibilidade. A recuperação reflexiva e etimológica da “estética” representava, de um modo geral, o início de um longo processo de apreensão e desenvolvimento conceptual em torno das possibilidades de determinação a priori do conceito de arte, enquanto reflexo de uma unidade e verdade absolutas. A estética resultava então de uma clara necessidade de realizar e reconhecer um espaço de manifestação da totalidade das faculdades do sujeito, definindo o domínio da arte como conteúdo privilegiado de formulação teórica e filosófica, tarefa que iria envolver a reflexão e a produção artísticas num cruzamento de influências e ideias simbolizadas desde logo pelo “idealismo alemão” e situadas na progressiva “autonomia da arte” que a estética, directa ou indirectamente, promoveu.

Porém, tal como nos lembra Silvina Rodrigues Lopes, “de Baumgarten a Kant, a estética passa de um projecto de autonomia, até aí tornado inviável pela própria crença num saber absoluto (o de Deus, face ao qual a sensibilidade era origem de imperfeição), à constatação da impossibilidade desse projecto, ou seja, da impossibilidade de determinar o belo a partir de conceitos”[3], dessa forma se limitando a reflexão sobre a arte às condições formais do juízo estético.

No final do século XIX, na sua Crítica da Faculdade do Juízo[4], Kant procura justificar uma espécie de encontro do intelecto (razão) e da vontade (acção), na relação harmoniosa do juízo estético, no qual se deveria revelar o sentimento do belo ou do sublime. Dá-se, assim, a harmonia das faculdades: o sentimento do belo apresenta-se como unidade da natureza e da liberdade que, no entanto, permanece essencialmente subjectiva e sem conceito. Kant admite no prazer estético uma forma de conhecimento autónomo, (porque sem conceito possível), do conhecimento teórico[5] e do uso prático da razão, ou conhecimento prático[6]. Todavia, o valor atribuído ao juízo estético permanece reduzido ao efeito de unidade, enquanto o conhecimento da razão prática tem em Kant o privilégio da valorização maior, na sequência ainda da herança iluminista, ou da Aufklärung.

Assim, em Kant, o juízo estético é desinteressado, porque a experiência do belo não faz do objecto o meio para a realização de um fim, sendo sempre subjectivo e universalmente comunicável. No juízo estético, o acordo entre o intelecto e a imaginação permanece referido ao sujeito e ao seu sentimento de prazer. Ao mesmo tempo que é harmonia como livre jogo das faculdades, o prazer estético é também uma finalidade sem fim, aí se jogando a sua possibilidade universal e inexprimível. No juízo de gosto, isto é, na experiência positiva do sentimento do belo, o sujeito relaciona-se harmoniosamente com a natureza, aí se revelando a verdadeira essência da liberdade[7]. Será na extrema valorização desta ideia de liberdade e de que “o belo é símbolo do bem moral”[8], que os discursos especulativos em torno da ideia de arte vão fazer da “estética idealista” do romantismo alemão, no início do século XIX, o responsável essencial pelo processo de autonomização da arte, considerando o belo não apenas “símbolo”, como em Kant, mas sobretudo expressão maior e apresentação em si da verdade absoluta.

Aos valores essenciais da filosofia kantiana sobre o juízo estético confere a “estética idealista” novo e diferente valor, partindo, no entanto, do estímulo expresso na estratégia de Kant sobre a legitimação da arte como problema filosófico. Desse modo, Schiller irá, igualmente, recuperar o projecto inicial de Baumgarten, e submeter a princípios racionais o juízo do belo, elevando-o à dignidade de uma ciência, unindo assim os dois propósitos, mas desvirtuando, no entanto, a essência do projecto kantiano, quando propõe uma educação pela estética.

De facto, podemos entender, de um modo geral, o “idealismo absoluto” de Schiller, Novalis, Fichte, e, mais tarde, Schelling, Schlegel, e mesmo Hegel, como uma leitura e interpretação livres da filosofia kantiana com vista à determinação de um belo absoluto, identificável com a natureza, o bem e a verdade, assumindo assim, expressamente, um valor teleológico, de finalidade. Se, em Kant, a racionalidade estética se situava na valorização da filosofia como ciência, o idealismo absoluto pretende, de um modo geral, definir o lugar da filosofia como anterior à ciência, localizando a literatura ou a arte como o lugar essencial da filosofia. Dado que a verdade absoluta é aqui de matriz literária, também o conhecimento que a persegue deve permanecer no âmbito da subjectividade literária e artística.

Nas Cartas Sobre a Educação Estética do Homem[9], Schiller revela, desde logo, o carácter essencial de um idealismo especulativo que dirige a crença absoluta na salvação do sujeito por meio de uma “ideologia da estética”[10], ou a educação pela paixão da arte, na valorização da pura e bela aparência como expressão de verdade, concluída na ideia extrema de que, “quando cultivamos as nossas faculdades estéticas, cultivamos as nossas faculdades morais, de tal maneira que a educação estética torna dispensável a educação moral”[11]. A ideia de um Estado estético, como realização do absoluto, entre a estética e a ética, resume a proposta schilleriana que, dessa forma, “realizaria a emancipação e a liberdade, a harmonia dos homens entre si e dos homens com a natureza, no qual os homens seriam tratados com a dignidade que lhes corresponde por natureza e alcançariam o desenvolvimento pleno e livre de todas as suas potencialidades”[12]. Esta será afinal a utopia maior que servirá a matriz essencial da estética idealista da universidade de Iena.

Contudo, e segundo Habermas, convém sublinhar que “a utopia estética de Schiller claro que não visa uma esteticização das relações da vida, mas sim o revolucionar das relações de entendimento recíproco. Perante a dissolução da arte na vida (…) que os dadaístas e os seus seguidores querem levar a cabo provocatoriamente, persiste Schiller na autonomia da pura aparência”[13]. O processo de autonomização da ideia de arte em Schiller será igualmente determinante para Fichte e o princípio de um “eu  absoluto”, (a subjectividade elevada ao extremo), e do génio criador perante o confronto pulsional entre Eros e Tanathos, bem como para o idealismo transcendental de Schelling. Este último, fala de uma oposição infinita entre entendimento e sensibilidade, considerando que a tensão dos opostos aí estabelecidos se reflecte no finito da obra de arte, ou, segundo L. Venturi, é como se o “infinito expresso de modo finito fosse a própria beleza”[14]. Desta forma, Schelling valoriza sobretudo o conceito e a ideia de arte, através de um belo absoluto por ela revelada, tomando-a como verdade e essência, que se mantém para lá da matéria e da forma da própria obra. A arte, como lugar e privilégio do pensamento, estratégia e globalidade simultâneas, declaração ético-estética, afirma, a sublimação do acto e, principalmente, da ideia em torno dessa espécie de reconstrução do humano. Devemos lembrar igualmente que, de uma forma geral, todo o idealismo alemão é uma espécie de contraponto ao Iluminismo de raiz racionalista.

Inicialmente, também Hegel irá defender como autofundamentação da modernidade, com Hölderlin e Schelling, uma “arte enquanto poder de conciliação que aponta para o futuro. A religião da razão (acrescenta Hegel) tem de se entregar à arte para se transformar em religião do povo”[15]. Hegel  entende também o belo e a arte como verdades últimas que se apresentam ao sujeito, numa osmose entre estética e ética. Desse modo, o objectivo da arte será manifestar a verdade sob a forma da representação sensível[16]. Todavia, esta utopia estética rapidamente se converte na descrença total relativamente a uma arte como manifestação da ideia ou conciliação última, transformando-se o discurso de Hegel no anúncio da “morte da arte”, quando reconhece à filosofia a tarefa magna no processo de emancipação do “Espírito Absoluto”[17]; ou como nas próprias palavras de Hegel – que se apresentam como primeira crítica negativa à própria “estética idealista” – “em todos os aspectos referentes ao seu destino, a arte é para nós coisa do passado. Desse modo, perdeu tudo quanto tinha de autenticamente verdadeiro e vivo, a sua necessidade e realidade de outrora, e encontra-se relegada na nossa representação.”[18] Para Hegel, o desencantamento desta determinação resulta da consciencialização e esclarecimento de que o Espírito Absoluto, enquanto realidade dialéctica, apresenta-se ao longo da História como progressão da consciência de liberdade, em direcção a uma espécie de verdade e totalidade futuras onde, aparentemente, a etapa da sua realização pela arte se apresentava já concluída, revelada numa espécie de superação do sensível no conceito. Esta superação pode ainda ser compreendida no seguimento do processo de sucessão das formas artísticas – simbólica, clássica e romântica – e o seu reflexo na ordenação hierárquica das artes, da arquitectura à poesia, a qual resulta necessariamente, para Hegel, na declaração da “morte da arte”, pela evidência da sua dissolução na filosofia, mediante o último estágio do sensível na arte: a poesia. Ainda assim, de um modo geral, como afirma Silvina Rodrigues Lopes, “a filosofia de Hegel não renega o valor ontológico que os românticos atribuem à arte. Também não rejeita o seu historicismo. No entanto, estabelece uma demarcação rigorosa entre a estética como filosofia da arte e a própria arte. É porque a filosofia corresponde a um nível de conhecimento superior ao da arte que ela se pode pronunciar sobre esta, a qual, por sua vez, é destituída de qualquer capacidade de reconhecimento de si. Mas a filosofia não é apenas superior à arte, ela é lhe posterior, No percurso da realização do Espírito, a arte como ‘manifestação sensível da Ideia’ está antes da filosofia. Embora ambas pertençam ao Espírito Absoluto, o historicismo que as hierarquiza implica que a filosofia só possa falar da arte a partir do momento em que ela acaba, ou seja, a partir do momento em que deixa de ser possível a realização da ‘Grande Arte’.”[19]

Apesar de tudo, a filosofia hegeliana da arte contribui ela própria, paradoxalmente, para uma crescente autonomização da arte, considerando que a sua argumentação em torno da analítica do belo se situa ainda no plano de um idealização absoluta da arte, num processo de conceptualização que determina a separação inevitável do mundo que justifica essa mesma reflexão, dessa forma contribuindo, por um lado, para a emancipação e elevação da arte ao nível do pensamento e da razão sobre ela própria e, por outro, para uma suspensão, senão mesmo superação, da função mito-religiosa que antes a caracterizava.

Sob a estratégia de idealização absoluta da arte dá-se uma transformação funcional na qual residirá, provavelmente, a razão da realização de uma arte que se promove e valoriza no contexto de uma classe social, a burguesia, também ela em ascensão definitiva aos lugares de poder, substituindo a Igreja e a religião na condução das massas, agora cada vez mais inspiradas pela crença nos valores liberais da filosofia iluminista. Neste processo de afirmação dá-se, inevitavelmente, uma espécie de “sacralização da arte”, substituindo-se, de algum modo, ao mito da religião, fazendo da arte, e da sua ideia a nova e determinante transcendentalização do homem e do sujeito. Desse modo, e partindo sobretudo da sobrevalorização do conceito de arte e da noção de génio criador, de um sujeito todo poderoso, a “estética idealista” contribuiu decisivamente para a “autonomia da arte”, na progressiva institucionalização da sua esfera de apresentação, separada cada vez mais de uma praxis vital efectiva.

As razões essenciais que sustentam a progressiva distanciação da praxis artística relativamente a uma praxis vital, tal como a definiu Peter Bürger em Teoria da Vanguarda[20], encontram-se, por um lado, na ideia de que toda a Estética é uma ontologia da obra de arte, na medida em que se coloca na perspectiva do essencialismo da questão “O qué (a) arte?”, e, por outro, no valor da resposta a essa mesma questão, pretensamente realizada pela “estética idealista”, na elaboração de um programa que, na sua pretensão de universalidade, cristalizou as categorias que a constituíam, resultando, finalmente, num projecto normativo que se definiu no apriorismo dos conceitos ideais do belo e do sublime, da imaginação e da criação como formas universais de acesso à verdade; aspiração última para um retorno à unidade e liberdade total da experiência humana, fragmentada já, na sua globalidade, pela metafísica da razão, o espartilho que havia despojado, segundo os românticos, o mundo e a vida da sua totalidade.

Por outro lado ainda, a confirmação do processo de autonomização da arte, como status específico da “instituição arte”, resulta, segundo Habermas, da compreensão de que “a arte só se estabelece como autónoma na medida em que os sistemas económico e político, com o aparecimento da burguesia, se desligam do cultural, e as imagens tradicionais do mundo, infiltradas pela ideologia básica do intercâmbio justo, separam as artes do contexto das práticas rituais.”[21] O esteticismo desenvolvido ao longo do século XIX a partir da “estética idealista”, e que é caracterizado pela afirmação total de uma “arte-pela-arte”, apela, na dialéctica estabelecida entre forma e conteúdo da obra, a uma valorização progressiva da forma, em detrimento dos conteúdos políticos e sociais da obra concreta, isolando-se nos problemas internos dessa opção, factor igualmente determinante para o processo de autonomia e isolamento global da praxis artística.

A interpretação da “autonomia da arte” é plenamente reforçada por Peter Bürger do seguinte modo: “só no momento em que os conteúdos (da obra) perdem o seu carácter político e a arte deseja simplesmente ser arte, se torna possível a autocrítica (tarefa realizada pelas vanguardas) do subsistema social artístico”[22]; ou, ainda Bürger: “a completa diferenciação do subsistema, que começa com l’art pour l’art (…) deve relacionar-se (para além da importância decisiva do advento da fotografia como novo meio técnico de representação da realidade, apontada por Walter Benjamin) com a tendência característica da sociedade burguesa para a progressiva divisão do trabalho, (onde) (…), também os artistas se transformam em especialistas.”[23] Com a autonomização, separação e desenvolvimento consciente das funções sociais dá-se, obrigatoriamente, uma diminuição da experiência e da participação da arte na praxis social, identificada no seguinte exemplo: definindo-se genericamente a experiência “como um conjunto de percepções e reflexões assimiladas, que podem voltar a aplicar-se à praxis vital; então, é possível caracterizar o efeito sobre o sujeito dos âmbitos sociais parciais, resultado da progressiva divisão do trabalho como diminuição da experiência”; contudo, “esta diminuição não significa que o sujeito, transformado em especialista de um âmbito parcial, já não perceba nem reflicta; no sentido proposto aqui, o conceito significa que as ‘experiências’ obtidas pelo especialista no seu âmbito parcial já não voltam a aplicar-se à praxis vital. A experiência estética como experiência específica, tal como o esteticismo a desenvolve, seria a forma em que se manifesta a diminuição da experiência – no sentido acima definido – no âmbito da arte.”[24]

Deste modo, é sobretudo no âmbito de uma perda da função social e da diminuição da experiência que deve ser compreendida a separação e a “autonomia da arte” relativamente à praxis vital, bem como o resultado do desenvolvimento do esteticismo originário da “estética idealista”. Será precisamente sob o projecto de recuperação de uma arte mais próxima e interveniente na praxis vital que as vanguardas históricas irão actuar contra a “instituição arte” e o isolamento a que ficou votada.

Assim, mais do que a interpretação ou o conhecimento da praxis da arte, a estética desenvolveu a reflexão sobre o conceito e a ideia de arte, como essência e lugar de uma superior manifestação do sujeito criador, agora capaz de rivalizar com a própria natureza, mediante a obra humana. Com a estética procurava-se na arte, sobretudo, uma instância explicativa ou de legitimação, oposta à empiria e à razão tornadas metafísica, que constituísse uma determinação segura acerca do conceito e da experiência do belo como princípio objectivo do gosto. A este propósito, afirma Maria Teresa Cruz: “A emergência da estética no interior da filosofia, no século XVIII, obriga a filosofia à focalização da temática da ‘experiência’: isto é, a tomar em conta a presença do sujeito no mundo, como aquilo que permanece na obscuridade, apesar, ou talvez mesmo como consequência, das tentativas iluministas da objectivação do mundo. Ela põe em cena noções como as de sensibilidade, sentimento, gosto, imaginação, génio, evidenciando todas elas, enquanto categorias, dois aspectos comuns: todas elas são categorias da subjectividade, e todas oferecem uma espécie de resistência à definição e à conceptualização, como se comungassem de um inefável ‘je ne sais quoi’, expressão que surge na época frequentemente associada à temática do gosto.”[25] Assim, à hegemonia da razão opõe a estética a experiência individual e subjectiva, pelo sonho e a imaginação, a evasão e o devaneio, a ilusão e a quimera, na assunção transcendental de um belo como modelo de humanidade, nisso se assumindo claramente como humanismo e utopia, à semelhança dos utopismos desenvolvidos ao longo do século XIX na sociedade ocidental; dos quais o “socialismo utópico” de Saint-Simon, Fourier, e Owen, e o “socialismo científico” de Marx e Engels são exemplo maior. A utopia de um “Estado Ideal”, do equílibrio social e do progresso, pode ser, na sua essência e estímulo, identificada com a “estética idealista” e o seu projecto de uma “Arte Ideal”, apresentando-se ambas, igualmente, em demanda de uma realização total do homem, na unidade requerida pelo espírito. Tal como afirma Maria Teresa Cruz, o carácter de “resistência e de salvação” da “estética idealista”[26], identifica decisivamente o seu propósito de refundação cultural humanista, como uma espécie de nova origem, caracterizada pela pureza de uma afirmação ético-social, na assunção da experiência aparentemente privilegiada da educação pela arte. Afinal, não podemos esquecer que toda a estética resulta e evolui do messianismo schilleriano de “exigir que o que existe seja belo, bom e perfeito.”[27]

 

As vanguardas históricas e a “instituição arte”

 

A modernidade é uma espécie de autodestruição criadora….

a arte moderna não é somente filha da idade crítica, mas crítica de si própria.

 

Octavio Paz.

 

Com o desenvolvimento do projecto filosófico cartesiano, o domínio privilegiado da razão promovera uma extrema fragmentação do sujeito, convertendo a emancipação e a autonomia do conhecimento em valores essenciais, dessa forma elevando o projecto iluminista da modernidade a todas as esferas do saber, nomeadamente, nos seus níveis moral-prático, cognitivo-instrumental e estético-expressivo[28].

Por outro lado, o processo de autonomia das esferas do conhecimento determinara o desenvolvimento de uma institucionalização generalizada das diversas áreas de especialização, configurando assim as suas leis próprias de legitimação e desenvolvimento. Neste contexto, a “instituição arte” edificou uma sólida estrutura de autonomização, onde a “Academia” – com origem em Platão mas fomentada, sobretudo, a partir do século XV, com o renascimento italiano – se afirma substancialmente enquanto lugar central no que à arte diz respeito, do ensino à exposição, ou da encomenda à legitimação teórica.

A tradição, baseada na recuperação dos cânones da Antiguidade Clássica ou na defesa de valores intemporais, adquire assim uma consideração que se prolonga mesmo para lá da famosa e académica “querelle des anciens et des modernes” do século XVII. E é precisamente na desvalorização do domínio de uma arte presa aos modelos ideais e objectivos do bem e do belo a partir dos cânones da arte da Grécia Antiga, que todo o romantsimo alemão procura propor a defesa da subjectividade absoluta do acto criativo, propagando assim, mais do que uma filosofia, uma expressão autoconsciente como reflexo de antropologia.

Os mecanismos de autofundamentação da “instituição arte” resultam, desde o início, de uma rígida determinação regulamentar análoga à tendência geral da sociedade do “Ancien Regime” de olhar a mudança e a novidade com reserva e distanciamento, sobretudo se não estiver de algum modo relacionada com a ciência e a razão. Apesar disso, e com a ascensão progressiva da burguesia após a Revolução Francesa, a arte revela um desenvolvimento de produção e recepção que extravasa o domínio privado e de classe, para passar a apresentar-se publicamente, dessa forma se criando e desenvolvendo uma “crítica de arte” que teve em Diderot o seu primeiro grande protagonista. Deste modo, podemos entender que, a partir do século XVIII, a “instituição arte” irá reforçar a sua estratégia de aglutinação e movimentação concentracionária, realizando uma rápida evolução de estatuto, alcançando uma legitimação e um poder autónomos.

A dimensão e o conteúdo das categorias constituintes da “arte autónoma” e da “instituição arte”, tal como as define Peter Bürger, enquanto “finalidade, produção e recepção”, reforçam a ideia de uma praxis artística distanciada da praxis vital. Porque, se a “arte sacra e a arte da corte estão unidas, embora cada uma à sua maneira, à praxis vital dos receptores (…) (pois) como objecto de culto ou como objecto de representação, as obras de arte estão ao serviço de uma finalidade”[29], o mesmo não se poderá dizer no que à arte burguesa diz respeito; aí, “a representação da autocompreensão burguesa verifica-se num recinto próprio, alheio à praxis vital. O burguês, que na sua praxis vital se vê reduzido a uma função parcial (os assuntos da racionalidade dos fins) experimenta-se a si mesmo na arte como ‘homem’, e aqui pode desdobrar todas as suas disposições, com a condição de que este âmbito permaneça rigorosamente separado da praxis vital”[30], pois só, dessa forma, a arte resulta efectivamente aos olhos de uma burguesia activa e fragmentada nas suas funções sociais.

Toda a estratégia da “estética idealista” conduzira, durante o século XIX, à afirmação de uma arte burguesa, embora de pretensões universalistas, em que as categorias da obra se apresentavam como conteúdo essencial da praxis, reduzindo assim qualquer realização mais próxima do conjunto da sociedade, isolando-se, por conseguinte, em extrema autoreferencialidade.

Esta “coincidência entre instituição e conteúdo da obra era o motivo logicamente emergente da possibilidade do questionar vanguardista da arte.”[31] Tal como refere Bürger, “os vanguardistas tentaram (…) uma superação da arte no sentido hegeliano do termo, porque a arte não devia ser pura e simplesmente destruída, mas sim reconduzida à praxis vital, onde seria transformada e conservada.”[32]

Mais do que realizar uma superação da arte na praxis vital, a vanguarda pretendera sobretudo anular as pretensões de separação protagonizadas pela “autonomia da arte”, elevando a ideia geral de “organizar, a partir da arte, uma nova praxis vital”[33]; conseguindo apenas, desse modo, transformar de forma radical a praxis artística. E como se apresenta, afinal, essa transformação?

Partindo de um ataque directo à “instituição arte”, e a norma analítica e discursiva que a sustentava, a vanguarda propôs, no início do século XX, a ruptura com o passado e a tradição histórica como programa geral de manifestação, pretendendo superar o que até aí se apresentava modelarmente através do cumprimento das normas apriorísticas do “esteticismo” instituído.

Perante a cisão interna do sujeito e o confortável processo de autonomização da arte, o programa das vanguardas representava, sobretudo, uma proposta de reformulação generalizada, num processo que se pretendia de carácter refundacional, agora a partir de valores radicais de intervenção e ruptura, solicitando e exigindo uma praxis artística de carácter e acção ético-estética, assumindo-se também como (nova) praxis vital, desse modo associando uma maior aproximação da sua função particular aos valores e características que compunham a vida social.

Nessa espécie de declaração de intenções, tornada pública através do “manifesto”[34], reconhece-se nitidamente o carácter de ruptura que as vanguardas reivindicam relativamente à “autonomia da arte”.  A importância do manifesto como documento invariavelmente ligado às vanguardas políticas e artísticas terá de ter aqui um destaque sobre o seu carácter essencial. Documento de polissémicas características, o manifesto artístico representa de facto uma importância decisiva na apresentação, reforço ou complementaridade, de alguns dos actos e movimentos artísticos mais marcantes do século XX. A este procedimento a arte moderna  recorreu com frequência para fazer ouvir a sua voz e melhor alcançar os seus objectivos de transformação e reformulação da prática artística. Um manifesto surge quase sempre – seja na sua formulação política, artística ou outra – como uma declaração pública em que se expõem os motivos que levaram à prática de certos actos, ou apelam para a sua concretização, e que podem interessar a um colectivo. O manifesto é um texto normalmente breve e publicado em forma de folheto, artigo de periódico ou revista, com o nome de um movimento político, filosófico ou artístico. O manifesto tem por fim estabelecer a comunicação entre um indivíduo (ou grupo) com os seus potenciais destinatários. Determinado por um contexto histórico muito preciso, o manifesto pretende genericamente romper com o ambiente político e/ou cultural dominante. Constitui, portanto, um processo declarado (ou até por vezes inconsciente) de afirmação e presença mediante o peso e a importância da palavra escrita tornada pública. Procura-se assim, solenemente, deixar marcada uma intencionalidade transformadora. Animado, na maioria das vezes, por um espírito messiânico, o manifesto oferece-se como promessa de alternativa ou da diferença, proclamando a realização de algo novo. No contexto artístico, é também uma espécie de cartilha, exemplo a ser seguido, como referência aos grandes textos bíblicos ou históricos, ou, por contraste absoluto, enquanto aproximação aos relatórios científicos de outras áreas de investigação. Neste sentido, os manifestos surgem igualmente como modo de registar e transmitir os resultados de uma investigação artística, apontando para as suas técnicas, procedimentos, significados e conquistas, convertendo-se assim num manancial de novos termos e conceitos, oferecendo os neologismos que invadiram decisivamente o discurso sobre as artes de vanguarda e a sua repercussão social ao longo de todo o século XX. Enquanto programa de afirmação ideológica e estética, como no caso do Futurismo italiano, do espírito Dada e do Surrealismo, ou na definição de objectivos de prática disciplinar, como no caso da Bauhaus ou do De Stijl, o manifesto converteu-se no documento essencial de proclamação e defesa das vanguardas históricas.

É conveniente, porém, o esclarecimento essencial sobre o conceito de vanguarda aqui utilizado, dado que, se considerarmos o âmbito original das manifestações de cada grupo, entre o Cubismo e o movimento Dada existe menos em comum do que entre este último e o Futurismo. Desse modo, podemos dividir as vanguardas históricas em dois grupos fundamentais: o primeiro, que compreende o Cubismo, o Fauvismo e os vários Expressionismos (de exploração figurativa ou mais tendencialmente abstracta ou não-figural), apresenta-se enquanto exploração e ruptura revelada a partir dos meios próprios de expressão pictórica, realizando sobretudo um desenvolvimento sem precedentes das suas condições formais e estéticas; o segundo, constituído fundamentalmente pelo Futurismo, Dada, o Construtivismo Russo e o Neo-plasticismo, revela-se enquanto manifestação de uma lógica onde a ideologia, a autocrítica e a autoconsciencialização determinam a sua apresentação. As analogias variam, contudo, consoante as iniciativas de interpretação. Assim, se admitirmos como primordial a perspectiva ideológica de afirmação, e seguindo o raciocínio de Renato De Fusco, “enquanto o Cubismo, o Futurismo e o Abstraccionismo Construtivista possuem uma base positiva, o Dadaísmo, tal como o Expressionismo, assentam na base oposta.”[35]

No entanto, os valores essenciais que caracterizam as vanguardas históricas entendidas no seu confronto directo com a “instituição arte”, nomeadamente, a procura do “inverosímil e do absurdo”, tal como propunha Marinetti, ou o confronto como expressão libertária de um sentimento niilista, como no projecto global do movimento Dada, apresentam, ainda assim, diferenças importantes, enquanto estratégias de ruptura com o passado e a tradição.

À vitalidade e entusiasmo em torno da tecnologia moderna, que caracteriza o Futurismo enquanto gesto “higienista” que celebra a guerra como única solução para os males do mundo, responde Dada com a subversão, mediante esse “agressivo absurdo”[36] da ironia e da destruição de todas as crenças e convicções morais numa sociedade racionalmente instrumentalizada. Enquanto o Futurismo apresentava a ruptura como modo positivo de afirmação do homem moderno, mesmo se contra os “museus cemitérios” que reduziam as possibilidades de futuro da arte em Itália, o Dada expunha de forma contundente o ridículo de uma arte isolada e fantasiada nas suas pretensões de autonomia, perante a qual só restava o gesto de protesto e a provocação que substituiria o objecto e a arte, convertendo-se num jogo extremo de ironia e crítica, desse modo promovendo essa espécie de “cultura da negação” definida por Renato Poggioli[37]. De facto, segundo Adorno[38], o modernismo  apresenta-se menos enquanto manifestação positiva do que como processo ilimitado de “negação”, assumindo esta, progressivamente, o estatuto de programa essencial de acção, a partir de uma estratégia revolucionária assente na mudança e na afirmação do novo, na defesa frontal do inaceitável para a “instituição arte”.

Com as vanguardas históricas, o divórcio e a separação que se instalam entre as noções (até aí estabelecidas e reconhecidas como válidas) de obra de arte, artista, autoria e fruição, introduzem definitivamente no discurso da arte a consciência e a assunção autocrítica do seu progresso e desenvolvimento, baseadas na inovação e alargamento do espectro de experiências em torno de  valores formais e plásticos, de composição ou de função, num processo similar às ideologias revolucionárias criadas e alimentadas no contexto historicista e positivista do século XIX, herdeiras directas da filosofia idealista de Hegel, e a sua concepção dialéctica da realidade como um absoluto realizável, ou, em contraposição crítica, do materialismo dialéctico de Marx, simbolizando ambos, de formas diferentes, uma crença inabalável nos valores da evolução e do progresso da sociedade. É afinal desta sociedade em ebulição que as vanguardas vão querer fazer parte integrante, e activa o mais possível, procurando uma acção unificada e definitiva entre a estética e a ética, valorizando-se a si própria nesse mesmo processo de integração e participação.

A vanguarda manifesta-se de uma forma radical, entre o ímpeto de um ataque iconoclasta (no caso do espírito Dada) e a crítica ontológica (do Cubismo à Abstracção), seja a partir das suas condições formais, seja no carácter e sentido da sua acção. Por exemplo, “o Dadaísmo, o mais radical dos movimentos da vanguarda europeia, já não critica as tendências artísticas precedentes, mas antes a ‘instituição arte’ tal como se formou na sociedade burguesa.”[39] Neste contexto de afirmação, poderemos incluir ainda movimentos artísticos de vanguarda como o construtivismo e o Cubo-futurismo soviéticos, que desenvolveram pesquisas de ruptura, imbuídas num espírito de refundação ideológica do “homem novo”.

O projecto de inventar uma linguagem de ruptura, delimitando dessa forma a denúncia da precariedade que constituía a «instituição arte», numa espécie de falso poder de legitimação, apresentava-se, sobretudo desde o movimento Dada, como gesto e manifestação ética, na assunção clara de uma manipulação das fronteiras da arte, assumindo e revelando a ideia de que, mais do que um “conceito” (projecto da «estética idealista») a arte definia-se mais, no início do século XX, pelo seu carácter institucional, que tomava para si o programa de legitimação e distinção do que seria, ou não, uma obra de arte.

Na origem desse acto de ruptura estava igualmente uma intencional crítica às noções mais gerais da “arte autónoma” enquanto expressão máxima da individualidade e singularidade radical, embora, de outro modo, esses valores sejam preservados igualmente pelas vanguardas, contribuindo estas afinal, sobretudo, para uma dessacralização provocatória da função e do estatuto dessa singularidade criativa. Segundo Peter Bürger: “quando Duchamp, em 1913, assina produtos de série (urinol, garrafeira) e os envia às exposições, está negando a categoria de produção individual (mais do que a criatividade individual). A assinatura, que precisamente conserva a individualidade da obra, é o objecto de desprezo do artista, quando lança produtos anónimos, fabricados em série, contra toda a pretensão de criação individual (entendida nos limites da ‘autonomia da arte’). A provocação de Duchmap não só revela que o mercado de arte, ao atribuir mais valor à assinatura do que à obra, é uma instituição controversa, como ainda faz vacilar o próprio princípio da arte na sociedade burguesa, segundo o qual o indivíduo é o criador das obras de arte. Os ‘readymades’ de Duchamp não são obras de arte, mas manifestações. O sentido da sua provocação não reside na totalidade da forma e conteúdo dos objectos particulares que Duchamp assina, mas unicamente no contraste entre os objectos produzidos em série, por um lado, e a assinatura e as exposições de arte, pelo outro.”[40] Neste contexto, a anti-obra que a vanguarda promove resulta da intenção evidente de, por um lado, reduzir o estatuto e o privilégio da “instituição arte” e, por outro, de com essa manifestação tornar mais claro o conteúdo do subsistema artístico. O conflito entre as noções de obra e anti-obra reflecte-se, desde então, numa espécie de jogo em torno do “acto de enunciação”[41] do qual fazem parte a assinatura e o título que, dessa forma, são os responsáveis maiores por uma espécie de apresentação e legitimação da obra de arte.

Esses registos de “para-obra” (o título e a assinatura), tal como os define Maria Teresa Cruz seguindo a leitura de Thierry de Duve[42], revelam-se enquanto “elementos marginais, como agentes de delimitação, (dado que) permitem supor, não uma essencialidade da obra, mas antes o modo de ser da obra, isto é, um conjunto de condições para a sua existência e circulação na nossa cultura.”[43] A passagem de uma consciência essencialista da arte para uma interpretação de carácter institucional caracteriza-se como uma das alterações fundamentais introduzidas pelo projecto artístico das vanguardas históricas.

É da percepção de que “a totalidade da obra e a identidade da arte, são o resultado de um recorte de tipo institucional, cuja força depende continuamente dos elementos marginais que, em cada caso, o enunciam de novo”[44], que resulta a denúncia do carácter institucional da arte. Por isso, quando se fala de anti-obras deve compreender-se, de igual modo, a relação íntima que as liga às obras que se manifestam e apresentam na “instituição arte”. Afinal, uma anti-obra só é reconhecida, paradoxalmente, enquanto obra, quando a sua manifestação mantém um qualquer vínculo com a “instituição” que pretende questionar[45].

E porque instituir é declarar o reconhecimento, a anti-obra, ou a obra de vanguarda, joga-se sempre no âmbito de uma ampliação das fronteiras que enunciam a obra de arte. Com isso, a obra de vanguarda “força o juízo estético a abandonar a discussão do gosto e a classificação da obra numa hierarquia de categorias estéticas, reduzindo-a à radicalidade binária do ‘é arte’ ou ‘não é arte’, na medida em que procura romper constantemente o consenso estabelecido em torno do nome”[46], confundindo-se este com a última possibilidade normativa e de juízo.

Para esse movimento de progressiva abrangência, jogado num processo extremo de aceitação versus exclusão, muito contribuiu o gesto de demarcação que simboliza o novo, como forma de niilismo ortodoxo, negação do passado que, com a proliferação das vanguardas, rapidamente se confunde numa lógica de fuga para a frente que a si própria se subverte, revelando a tautologia da sua acção.

Por outro lado, o novo, como recusa sistemática da tradição, encontra na experimentação e reconhecimento dos valores emergentes da contemporaneidade vivida, pelo menos desde a precursora consciencialização de Baudelaire revelada em O pintor da vida moderna (1863)[47], a matriz fundamental dos actos de vanguarda, na frontal negação valorativa das normas tradicionais da “arte autónoma”, na assunção do cosmopolitismo da vida citadina, numa postura onde o nonsense rapidamente adquire visibilidade.

No entanto, a sistemática dialéctica entre o novo e a tradição, logo se tranformou, paradoxalmente, naquilo que Harold Rosenberg apelidou, mais tarde, de “tradição do novo”[48], como se a vocação de ruptura, subversão e transgressão que caracterizou as primeiras vanguardas se convertesse numa espécie de aceitação incondicional, um “não-importa-o-quê”, como refere Thierry de Duve[49], apenas submetido ao critério da “enunciação”.

De facto, a partir do gesto vanguardista, o estatuto da «instituição arte» revela-se essencialmente ligado, tal como referiu Walter Benjamin[50], a uma obra de arte que vê o seu valor de culto ser substituído apenas por um valor de exposição, tornando-se assim essenciais os valores do “acto de enunciação”, essa “margem nominalista da obra”[51].

Dessa forma, poderemos afirmar que o que se mantém ainda nas vanguardas históricas do projecto inicial da “estética idealista”, são as categorias de autenticidade e originalidade, intimamente relacionadas com as de autoria e singularidade, embora valorizadas já não a partir da produção da obra de arte, mas antes por essa “estratégia de redução”[52] que é responsável por uma nova consciência dos valores da criatividade e da participação do sujeito no domínio da arte, abandonando as pretensões do gosto tornado universal, para se refugiar numa subjectividade irredutível a qualquer poder absoluto.

Em íntima conexão com a singularidade autoral, o desenvolvimento quase exclusivo desse último critério resulta, contudo, numa espécie de “mito da originalidade”[53], que se constituiu, ainda assim, para lá da aparente anarquia, como critério primordial de hierarquização entre a arte de vanguarda. Do mesmo modo, e segundo Rosalind Krauss, o mito do original entre as vanguardas revela-se na procura sistemática de um ingénuo e pretensioso grau zero, puro e primitivo: “a originalidade converte-se na metáfora organicista referida não tanto à invenção formal como às fontes da vida. A entidade original está a salvo da contaminação da tradição porque possui uma espécie de ingenuidade primitiva. Como afirmou Brancusi, ‘Quando deixamos de ser crianças, estamos mortos’. A entidade original tem a potencialidade da regeneração contínua, da perpetua autogestação. Tal como declarou Malevich, ‘Só está verdadeiramente vivo aquele que derruba as suas antigas convicções’. A entidade original permite estabelecer uma distinção absoluta entre o presente experimentado de novo e um passado carregado de tradição.”[54]

O novo onde se procura a originalidade máxima, interfere, por outro lado, no alargamento das fronteiras da arte promovido pelo gesto vanguardista, que foi responsável, igualmente, pela instauração de uma crise sem precedentes, tanto na “instituição arte” como ao nível das categorias da estética, nomeadamente, em relação ao critério do belo. Contra a tradição e o programa normativo da “autonomia da arte”, a vanguarda propõe a experimentação fragmentária, a pesquisa de um novo programa, ou, no caso de algum Dadaísmo, apenas uma “estética da indiferença”, tal como se referia Duchamp relativamente à escolha dos readymade: “é preciso chegar a qualquer coisa de uma indiferença tal, que não se tenha nenhuma emoção estética. A escolha do ‘readymade’ é sempre baseada na indiferença visual, e ao mesmo tempo, numa ausência total de bom ou mau gosto.”[55]

Para lá de qualquer discussão em torno das categorias da “estética idealista”, a crise instituída pelas vanguardas releva afinal do facto de cada gesto ou obra vanguardista ser sempre uma interrogação sobre o próprio conceito de arte, no declarado abandono da ilusória segurança promovida pela “autonomia da arte”. O projecto de dessacralização da arte resulta assim evidente, pela pretensa dissolução de uma prática artística aparentemente fixada no valor da “arte-pela-arte”, admitindo agora, e cada vez mais, o acaso do contexto social, o “encontro fortuito”, esse rendez-vous plural e diverso que significa todo o gesto duchampiano.

Com as vanguardas históricas, inaugura-se uma outra legitimação e forma de pensar a arte, como novo código de linguagem artística, retirando ao criador (artista) o estatuto supremo relativamente à obra de arte, promovendo o fruidor (observador) a entidade fundamental do processo criativo, comprometendo-o eticamente, na maior responsabilização da recepção dessa mesma obra de arte. Apresentando o inapresentável, a arte apresenta-se antes enquanto problema moral e de consciência, fonte de desestabilização e não de segurança. Afinal, e seguindo Luc Ferry, a preocupação hiperclássica de destinar à arte uma função de verdade, (pelo menos no entendimento que lhe dá a “estética idealista”), é abandonada pelas vanguardas históricas, traduzindo a arte não mais uma realidade estritamente racional, harmoniosa, ou euclidiana, mas antes uma realidade sobretudo ilógica, caótica, informe e idiossincrática[56].

A verdade não é mais, na acção da vanguarda, o acordo entre o juízo e a coisa, tal como pretendia Descartes, mas a apresentação da descoberta como emancipação e independência total, consagrando por isso a inovação, ou o novo, como critério supremo do juízo sobre a obra de arte, e expressão máxima da autonomia do sujeito criador. Este não é já fruto de um todo e de uma tradição, mas o resultado mais visível e fragmentário da negação do passado ao pretender conceber “uma origem total, como um começo desde o zero, como um nascimento”[57] num esforço de extrema e absoluta autocriação.

 

A dimensão de utopia nas vanguardas do século XX

 

Porquê perder tempo a realizar o possível?

Gertrude Stein.

 

Podemos situar no jogo da institucionalização discursiva da modernidade a matriz essencial sobre a transferência dos valores de unidade e identidade global do âmbito do mito, e da experiência ritualista de cariz religioso, para o de desocultação desse mesmo nível de experiência, através da razão, ou de uma espécie de racionalização da natureza, antes preservada e identificada com o domínio ou a expressão de um absoluto, o da “transcendência”.

Neste sentido, a relação com o “transcendente” remete sempre para uma aproximação e consciência da dimensão totalizadora de um lugar de perfeição como advento e, simultaneamente, como projecto final, ponto de chegada de todo um devir. Desse modo, a reflexão sobre o lugar perfeito, alimentada por uma teleologia necessária, resultou, não raras vezes, na idealização sem limite do possível lugar onde a felicidade, a harmonia e o apaziguamento da condição humana e da natureza reforçasse a ideia de uma realização total e eterna daquilo que o espírito humano é capaz de alcançar e, sobretudo, imaginar. É isso que nos revela, por exemplo, Platão em A República, e a sua Cidade-Estado ideal, ou Stº Agostinho e A Cidade de Deus formada apenas pelas virtudes mais nobres do homem.

Mas que lugar é esse que se anuncia permanentemente? A esta pergunta sem resposta, deu Thomas More, no século XVI, nova configuração e consciência partindo de uma particular reinterpretação da palavra lugar – enquanto “topos” -, para fixar o termo que identifica claramente o irrealizável, o sonho referente ao lugar idealizado, ou seja, a “u-topia” enquanto expressão de um “a-lugar”, “país de parte nenhuma”, que em More é a “ilha” perfeita, em contraposição à ilha do reino de Inglaterra, nessa época assolada pelo conflito e desarmonia constantes[58]. Uma vez mais, agora na figura da utopia, se projecta o lugar ideal e perfeito, reflexo da unidade e liberdade total, em harmonia eterna. Daqui resulta a identificação da utopia com o irreal, pois nas utopias há sempre uma espécie de rejeição do real, um refúgio no ideal que lhe impede, aparentemente, qualquer noção mais pragmática. Assim, a utopia ganha um valor extremo de representação ideal, instrumento teórico e retórico capaz de aclarar, ou clarificar – no dualismo conflitual entre um bem e um mal assumidos enquanto valores intrínsecos ao homem – tanto as intenções libertadoras do homem moderno, como a liberdade e a perfeição enquanto necessidades vitais unificadas. É esta unidade que se pretende agora do lado do sujeito e da razão, na figura do Estado Moderno, ou da ideologia da modernidade, no abandono do mito totalizador que, no entanto, garantia a unidade da consciência e da identidade do homem.

A “ilha” da utopia proposta por Thomas More resulta da elaboração e permanência de uma visão optimista sobre o projecto da modernidade, apesar das contrariedades dos factos, ou ainda da progressiva consciencialização do princípio de transformação da realidade, a partir da vontade dos homens. A perseguição do objectivo de uma sociedade perfeita, segundo a lei dos homens, é, de um modo geral, o sonho e a esperança da cultura humanista, e de todo o mundo moderno[59].

Podemos então compreender o pensamento utopista sobretudo como função reguladora constante que substituiu a concepção mitológica da religião, enquanto modelo de realização da vida e do homem. Devemos ainda tentar perceber esta utopia como resultado do desenvolvimento particular do humanismo moderno. Afinal, toda a história da modernidade e as filosofias do sujeito promoveram uma progressiva fragmentação entre o indivíduo, a sociedade e a natureza, e uma consequente perda, para lá da exclusiva orientação humana, da dimensão de unidade e finalidade globais.

Seja como ideal político a partir do qual é possível julgar e criticar a política real, seja como potencial de legitimação da ideia de uma felicidade humana ou de perfeição homogénea e eterna, que elimina os conflitos substituindo-os pela harmonia e o equilíbrio permanentes, a utopia representa desde cedo os valores mais nobres do messianismo e da determinação do esforço humano em realizar na vida terrena aquilo que antes lhe era prometido apenas na projecção idealizada de uma “vida celeste”. Há inclusive quem veja nesta transferência de funções uma continuidade da escatologia e do messianismo judaico-cristãos, embora sob novos modelos de apresentação, agora dominada pelos valores de um antropocentrismo absoluto.

De um modo geral, podemos afirmar que – nunca abandonando por completo, no entanto, os pressupostos da sua realização – a utopia se converteu, progressivamente, sobretudo num instrumento de crítica social e política, signo de uma responsabilização ante o futuro, baseado na elevação da razão enquanto modo de concretização mais viável desse lugar perfeito.

As diferenças de interpretação e utilização do conceito de utopia variam consoante as filosofias, segundo a sua orientação mais ou menos determinista. Assim, por exemplo, em Kant, a utopia aproxima-se fundamentalmente de um ideal regulador, enquanto Marx, no seu projecto de transformação social acusa a utopia de ser apenas “o sonho fora da história e do real”[60]. Seguramente, grande parte das ideologias, filosofias e políticas inspiradas no marxismo revelam uma forte consideração pelo pensamento utopista, chegando mesmo a confundir-se apenas com o sonho de uma “sociedade socialista”, ou a construção do “homem novo”, símbolo da perfeição.

Qual é, no entanto, a relação válida entre as várias noções de utopia e a arte em geral? Como vimos, a fragmentação do sujeito, enquanto resultado mais evidente do racionalismo instituído pela modernidade, limitou a consciência de uma eventual totalidade ou unidade da sua condição. Por outro lado, desde que a “estética”, como ramo autónomo da filosofia, se aproximou da determinação de uma espécie de jogo das faculdades do sujeito, ganhando mesmo dimensão radical, nomeadamente com o “idealismo alemão”, enquanto expressão máxima de uma experiência globalizadora, a arte, e tudo aquilo que lhe diz respeito, rapidamente adquiriram uma estreita identificação com a utopia, uma função quase metafísica, precisamente enquanto lugar possível de realização e afirmação total do homem, afastado dos limites instrumentais próprios da razão, que apenas realizara a separação, divisão, e desenvolvimento das várias esferas do conhecimento, desvalorizando a unidade aparentemente necessária à consciência global.

Deste modo, devemos entender os movimentos da vanguarda histórica não apenas como um projecto de contestação e desenvolvimento auto-referencial, como ainda uma espécie de continuidade relativamente às intenções redentoras da “estética idealista”. Apesar da aparente contradição, em ambas facilmente se reconheçe uma clara dimensão de utopia, quer esta se apresente pelo carácter normativo expresso na veemência das orientações (devemos mesmo interpretar o romantismo alemão como o primeiro movimento cultural moderno, precursor dos futuros movimentos de vanguarda) quer ainda nas características de afirmação refundacional que tanto a “estética” como, de outro modo radicalmente diferente, as vanguardas acabam por representar.

O processo de análise crítica, no sentido de uma aproximação progressiva aos valores da conciliação e realização total, esteve na base da maioria das intenções referentes ao pensamento utópico. Afinal, foi a crítica da realidade da Inglaterra do século XVI que permitiu a Thomas More imaginar a sua Utopia; ou não terá sido também na crítica da filosofia de Kant que Hegel determinou a sua filosofia dialéctica, ponto de partida para os mais extremos utopismos do século XIX? Como poderiam Owen, Cabett, Saint-Simon, Fourier e Proudhon conceber os seus utopismos de pendor socialista sem uma crítica veemente aos valores e consequências do liberalismo capitalista revelados nos desequilíbrios sociais a partir da 2ª Revolução Industrial?

Será então na herança da formulação e desenvolvimento desta consciência crítica com vista à determinação de um futuro melhor, que determinadas vanguardas históricas vão beber o essencial das suas orientações programáticas, quer estas resultem no belicismo e na velocidade exacerbadamente optismista do Futurismo, no ascetismo transformador do De Stijl, na esteticização estrutural proposta pela Bauhaus, ou ainda na autodespromoção e iconoclastia do Dadaísmo. O carácter utópico e totalitário da realização – pela positiva nos três primeiros casos, ou num sentido de clara negatividade no Dadaísmo – reforçam a ideia geral de um intencionalidade globalizadora e de resolução total relativamente às assimetrias e aos conflitos entre mundo interior e exterior, entre o particular e o geral, plenamente separados pela razão, e por completo desordenados desde pelo menos o “perspectivismo” aforístico de um Nietzsche, ou da revolucionária análise psicanalista do real promovida por Freud.

De resto, se até às filosofias positivistas da ciência a razão serviu incondicionalmente o processo de evolução crítica, já a partir de Nietzsche, Marx e Freud, o privilégio da razão e, principalmente, a sua omnipotência tornada mito ideológico seriam, progressivamente, postos em causa, culminando no desenvolvimento da chamada “teoria crítica” promovida pelo “Instituto de Investigação Social”, que ficou conhecido pela “Escola de Frankfurt”, num projecto realizado em torno da figura central de Max Horkheimer e a sua radical analítica sobre a crise do sentido, a decadência e a auto-destruição da razão, inicialmente afirmadas numa obra realizada de parceria com Adorno, a Dialéctica do Iluminismo (1944), onde se procedia a uma espécie de “Eclipse da Razão”[61], a partir do argumento fundamental de que, com a progressiva instrumentalização dos valores primordiais da razão, esta havia feito desaparecer a correspondência, inicialmente assegurada pela razão objectiva, entre indivíduo e sociedade, acentuando a ascenção do individualismo baseado na razão subjectiva.

Será importante ainda sublinhar que o utopismo característico da “Escola de Frankfurt” surge igualmente como consequência do marxismo crítico das primeiras três décadas do século XX, sobretudo nas figuras de Ernst Bloch, Theodor W. Adorno e Walter Benjamin, num contexto de plena afirmação das vanguardas históricas que, pela via da criação artística, realizavam também a crítica e a alternativa aos desaires do princípio do século. Mas, se nos anos 30 as teorias sociais de Hegel e Marx prevaleciam na «Escola de Frankfurt» ainda como referência ideológica e metodologia de análise essencial, já com a Dialéctica do Iluminismo dá-se um decisivo abandono do optimismo marxista, com ele mantendo, no entanto, algumas relações e afinidades. Este abandono estará sobretudo relacionado com um desalentado contexto. Não podemos esquecer que o fracasso da revolução socialista na Europa Ocidental, a transformação estalinista da revolução russa, bem como a afirmação do totalitarismo fascista-nazi na Alemanha, condicionaram a reflexão em torno da esperança marxista, transformando-se o projecto da Escola de Frankfurt na renúncia global, mas aparente, dos valores do iluminismo, definindo assim uma “teoria crítica” que se afirma antes por uma espécie de “utopia negativa”, de crítica e desocultação da ideologia do iluminismo.

Contudo, a “Escola de Frankfurt” mantém ainda de Hegel o valor operacional da “dialéctica”, elevando-o mesmo, numa aliança decisiva com a negação, a estratégia essencial da sua “teoria crítica” perante os “desastres” dos utopismos positivistas originários do século XIX, ou, por outra palavras, como se afirma na “Dialéctica do Iluminismo”: “A negação determinada rejeita as representações imperfeitas do absoluto, os ídolos, contrariamente ao rigorismo, na medida em que lhes opõe a ideia, com a qual não podem rivalizar. A dialéctica revela, assim, toda a imagem como escrita. Ensina a ler nos seus traços a confissão da sua falsidade, confissão que lhe arrebata o poder e o adjudica à verdade. A linguagem converte-se, assim, em algo mais que um mero sistema de signos. Com a noção de negação determinada, Hegel trouxe à luz um elemento que distingue o iluminismo da decadência positivista à qual ele o atribui.”[62]

Desta forma se afirma a característica fundamental da “Escola de Frankfurt”, isto é, o cepticismo perante a razão e todo o poder a ela associado, a partir de uma valorização particular do processo dialéctico como forma última de utopia, aqui entendida sobretudo enquanto estratégia de regulação e crítica profunda da modernidade. Por outro lado, devemos entender que a perda de confiança nas ideias sociais de Hegel e Marx leva Horkheimer a ver na modernidade apenas o ruído que destrói o homem, revelando uma espécie de “nostalgia do ser” presa à ideia de uma perda irreversível da razão objectiva, e consertada. De outro modo, a analogia elaborada por Horkheimer e Adorno entre o sucesso do nazismo e do estalinismo como opostos à imagem de liberdade futura anunciada por Marx merece hoje a maior das dúvidas, do mesmo modo que é difícil explicar o nazismo apenas pelo desenraizamento da sociedade de massas[63].

A “Escola de Frankfurt” assume igualmente uma perspectiva utópica em relação ao domínio da arte, encarando-o como lugar último para uma realização unificadora do ser, forma de negação da razão instituída, esse absoluto instrumentalizador da praxis vital, desse modo dando prosseguimento paradoxal tanto a alguns dos valores da “estética idealista” como às análises marxistas que defendem a ideia comum, tal como apontou Gianni Vattimo, “de que a demarcação da arte e a especificidade da experiência estética são aspectos da divisão social do trabalho que se deve eliminar com a revolução ou de algum modo com uma transformação da sociedade no sentido da reapropriação, por parte de todos, da essência do homem.”[64] Indirectamente, as análises dos membros da “Escola de Frankfurt” sobre o domínio da arte e da estética, sobretudo o Marcuse do Homem Unidimensional (1964) e o Adorno da Teoria Estética (1970), funcionam como um laboratório da utopia dos anos 60 e 70.

Neste sentido, devemos ainda considerar o mosaico plural das referências teóricas que enformam a consciência socio-cultural dos anos 60, nomeadamente os desenvolvimentos da “estética semiótica” (a partir dos estudos de Roland Barthes, Julia Kristeva ou Umberto Eco), de ascendência positivista e linguística, na elaboração de complexas relações de sentido entre significado e significante, dessa forma renunciando às estratégias de interpretação propostas pela “hermenêutica” de Hans Gadamer e Paul Ricouer. Por seu lado, o valor da análise da obra de arte e da criatividade realizado a partir da “interpretação”, como oponente ao valor da “formalização” (defendida pela semiótica), propõe, no essencial, a dissolução da estética numa teoria geral da interpretação, na linha da consideração de uma estética da recepção, apontada já pela filosofia heideggeriana. A defesa da “interpretação” recupera assim a origem do pensamento de Nietzsche e Heidegger, contrariando a importância da linha de análise promovida pela “crítica da linguagem” que se traduziu no desenvolvimento dos estudos linguísticos em torno do “signo” (de F. Saussure e Charles Morris, a J. Mukarovsky), dando origem tanto à “semiologia” como à plural proposta do “estruturalismo”, de Claude Levi-Strauss a Jacques Lacan.

Ainda assim, e de um modo geral, podemos afirmar que as vanguardas históricas haviam privilegiado uma dissolução da categoria da obra de arte, enquanto expressão dos critérios normativos do belo e do sublime inerentes à “estética idealista”, com isso procurando a utopia de uma refundação global que pôde ser paradoxalmente entendida por Dewey, nos anos 30, enquanto difusão de uma estetização da vida e do quotidiano pelo estímulo do design[65], a partir das propostas do De Stijl ou da Bauhaus, transferindo assim os valores que identificam a arte, sob o signo do esteticismo, para a pragmática do quotidiano percepcionado.

Por outro lado, já as neovanguardas surgidas nos anos 60 procuram uma generalizada “estetização da experiência”, assumindo, no entanto, forma diversas, podendo afirmar igualmente a assunção total das imagens da sociedade de consumo e pós-industrial, no caso da pop-art, bem como uma espécie de “resgate estético da existência”, desde o Neodadaísmo à arte povera, ou da body-art à land-art, ao qual Herbert Marcuse acrescentaria a dimensão do carácter revolucionário, procurando, não apenas uma estetização dos objectos que nos rodeiam, mas antes a experiência da felicidade pela arte, como “grande recusa”[66] de um mundo que realizou apenas O Homem Unidimensional, uma espécie de alienado, segundo Marcuse, para o qual a razão se identifica com a realidade e que, por isso, não consegue realizar a separação entre o que é e o que deve ser, limitando-se ao seu modo de existência demasiado dependente da sociedade tecnológica e das ciências, sem capacidade de sonhar o futuro.

A recuperação do sonho, numa estratégia próxima da grande maioria das neovanguardas, mediante a “grande recusa”, como “utopia negativa”, é proposta por Marcuse do seguinte modo: já que a razão instrumental anulou qualquer projecto fora do seu universo (industrial-tecnológico), cabe à filosofia (como reminiscência da “estética idealista”) a função ideológica de “terapia”, na elaboração de uma nova sociedade através de um “projecto transcendental”, dando maior oportunidade à pacificação da existência, mediante o equilíbrio entre o que se alcançou com a sociedade tecnológica e a reavaliação do poder de transformação da razão, isto é, “a Razão pode desempenhar esta função apenas como racionalidade pós-tecnológica, em que a técnica construa ela própria o instrumental da pacificação, o órgão da ‘arte da vida’. A função da Razão e a função da Arte serão então convergentes.”[67]

Marcuse pretende assim uma naturalização da razão, enquanto matriz da “arte da vida”, uma espécie de humanização, ou revolução espiritual e cultural, a partir da ideia de uma estética como utopia antropológica[68], dado que a consideração positiva do sensível devia ser estendida desde o domínio particular da arte à vida humana na sua globalidade, permitindo assim, segundo Marcuse, alcançar a felicidade como “forma definitiva de liberdade – um viver sem angústia”[69].

Neste contexto, o propósito das neovanguardas revela-se necessariamente como uma utopia diferente e, de certo modo, oposta à das vanguardas históricas, dado que nestas os valores tradicionais da estética pretendiam-se anulados ou, pelo menos, desvalorizados, enquanto nos anos 60 e 70, e apesar de em alguns casos se ter mantido ainda uma relativa “desesteticização do estético”[70], as neovanguardas realizam sobretudo uma espécie de conciliação entre o domínio da estética, assumindo-o enquanto critério definidor das fronteiras inalienáveis da “instituição arte”, e o domínio geral da vida, na progressiva aproximação e fusão entre ambas, criando uma maior expansão e extensão do conceito de arte, a partir da estratégia de apropriação de realidades não-artísticas, diminuindo assim o isolamento das chamadas “Belas-Artes” praticadas maioritariamente na “instituição”, ou na “academia”.

Deste modo, resulta lógica a aproximação realizada por Marcuse em relação à arte de vanguarda, dado que, logo em Contra-Revolução e Revolta (1972), anunciava a correspondência entre a arte vanguardista e o protótipo da revolução, a “grande recusa” e negação da sociedade contemporânea mediante a dialéctica da emancipação artística, defendendo que “em toda a obra de arte notamos a presença activa de uma ordem diferente da ordem constituída, há factos e possibilidades da existência humana vistos a uma luz diferente daquela que surgem na vida comum e por isso as normas que governam a ordem artística não são as mesmas que governam a ordem real, mas a sua negação. A própria arte de tradição burguesa veicula a ideia de um mundo liberto das forças repressivas, e assim até a arte burguesa exprime os objectivos da revolução total.”[71]

Ainda relativamente à acção das forças repressivas, já em Eros e Civilização (1955), e partindo de uma renovada interpretação das relações entre “Instinto” e “Razão” tal como estas se apresentavam na estrutura central da psicanálise freudiana, Marcuse pretendia a realização de uma espécie de utopia da liberdade e do desejo visando demonstrar que a auto-sublimação da sexualidade destrói o primado da função genital, transformando todo o corpo em órgão erótico e o trabalho em jogo e divertimento. A grande proposta de Marcuse relativamente às ideias de Freud será então a assunção de uma liberdade ilimitada baseada na não-repressão, ou, como nos diz Nicola Abbagnano: “Se Freud tinha dito que no choque entre o Eros e a Realidade, a Realidade deve vencer para tornar possível a sublimação do Eros nas formas superiores da vida espiritual e social, Marcuse considera que no mesmo conflito é o Eros que deve levar a melhor criando uma Realidade nova, ou seja uma civilização na qual deixariam de existir limites e repressões. Com a sua vitória, Eros libertaria o homem do labor, da renúncia, da moral, do sacrifício e do heroísmo, torná-lo-ia um livre contemplador da beleza. A própria sexualidade se libertaria da ordem repressiva da procriação, subtraindo-se à esfera genital e fazendo de todo o corpo um órgão de prazer.”[72]) O princípio de libertação total do Eros (a pulsão de vida) pretendia recuperar assim, baseado em nova configuração, a totalidade perdida do humanismo clássico, o projecto de emancipação humana. Deste modo, o optimismo alternativo e generalizado presente nas propostas marcusianas obteve uma enorme repercussão junto dos movimentos de juventude dos anos 60, colando bem com o discurso dos grupos minoritários de acção social emergente, nomeadamente, os que exigiam a afirmação da juventude enquanto grupo social interveniente, e se manifestavam contra a discriminação sexual, apoiando as reivindicações e a militança feminista, no contexto alternativo dos diversos fenómenos de contra-cultura registados quer nos E. U. A. quer em toda a Europa Ocidental, alimentando todos eles, de uma forma geral, o sonho de uma última utopia, assumindo a experiência do presente como plenitude e “nova sensibilidade” existencial, visualização redentora do futuro, na esteira ainda da dialéctica hegeliana.

O desenvolvimento tensional destas reivindicações crescentes culminaria assim nas manifestações sociais e políticas do “Maio de 68”, dos movimentos estudantis que gritavam a nova palavra de ordem: “a imaginação ao poder”, encontrando o seu reflexo artístico, antes e depois, em muitas das experiências e reivindicações do happening e da performançe, na dilatação ou expansão ilimitada das fronteiras da arte, progredindo numa estetização da experiência que deveria fazer frente ao mundo instrumental da razão, aproximando em definitivo, por essa via quase “terapêutica”, a arte e a vida.

No discurso das vanguardas deste século XX reconhece-se assim a permanência de uma teleologia que remete inexoravelmente para uma dimensão utópica, na profetização e procura sistemática, por um lado, da realização de um futuro idealizado enquanto lugar de perfeição e harmonia, na reconciliação do sujeito com o mundo e consigo mesmo, e, por outro, como consciência dessa impossibilidade, a partir de uma “utopia negativa” ou da valorização do “informe” através da mensagem de A. Artaud e G. Bataille.

Contudo, há algumas diferenças essenciais relativamente ao carácter e manifestação dos dois grandes períodos da vanguarda artística. Enquanto nas vanguardas históricas a negatividade servia essencialmente o conflito aberto com a “instituição arte” e os valores de uma “arte autónoma”, já as neovanguardas do pós-guerra procuram realizar sobretudo uma descomplexada estratégia de aproximação progressiva entre a “instituição arte” e o domínio geral da vida e do homem, podendo a negatividade reflectir-se apenas no que esse projecto comporta de confronto com o insustentável domínio da razão instrumental .

Ao longo de todas as manifestações de vanguarda verifica-se, genericamente, uma nítida passagem da “experiência estética à esteticização da experiência”[73]; primeiro, a partir da desvalorização da “estética idealista”, abandonando o pressuposto do uso dos seus valores apenas como interpretação, em favor de uma maior capacidade de transformação ética da arte e da história, aproximando definitivamente a vanguarda artística da vanguarda social e política que, desde os construtivismos vários à ambição de unir arte e trabalho com o projecto da Proletkult (cultura proletária), alimentaram a utopia dos vanguardismos mais extremos da primeira metade do século[74]; mais tarde, as neovanguardas dos anos 60 vêm propor a ampliação e o desenvolvimento das noções de produção e recepção da manifestação artística, a partir dos novos comportamentos e da desmaterialização generalizada da obra da arte, num arco que vai da performance à body-art, admitindo, contudo, na maioria dos casos, de diversos modos e intensidade, (se exceptuarmos a linha do conceptualismo linguístico e processual) alguns dos critérios normativos da “estética”, procurando alcançar já neste século, a partir das ideias de Dewey, ou Marcuse, a utopia da “esteticização da experiência”, através da criatividade colectiva das massas, ou da função redentora dos “operadores estéticos” que aponta para o sonho da esteticização da vida, através de uma “nova sensibilidade” que busca ainda a utopia da emancipação humana mediante a obra de arte, que assim mantém, apesar de todas as reduções, o seu estatuto essencial, embora já plenamente transformado, tocando em definitivo diversos domínios que, até aí, pertenciam exclusivamente à vida e ao quotidiano.

De resto, as vanguardas procuraram sobretudo o “impossível” que é sempre todo e qualquer projecto de utopia, essa experiência da temporalidade como trajecto entre o desregulamento do presente e a plenitude de um futuro apenas anunciado, essa “promessa de felicidade” que Sthendal tão bem identificou na longa caminhada da idade moderna. De outra forma, as vanguardas procuraram sobretudo o “impossível” que significa afinal o perseguir da unificação global entre o estético e o existencial, último mito possível, enquanto força totalizadora da consciência e identidade do Homem, em nome da origem e da unidade perdidas. De formas radicalmente diferentes, ou talvez não, a utopia e o messianismo de um futuro melhor estiveram sempre presentes, podemo-lo afirmar, tanto nos paradigmas da “estética idealista” do romantismo alemão, como nos programas de ruptura característicos das vanguardas artísticas do século XX.

 

[Versão original: in Arq.a – Revista de Arquitectura e Arte, nº 2, julho/agosto; nº 3, setembro/outubro; e nº 4, novembro/dezembro, 2000]

 

 

References
1 Cf. I. Kant, Crítica da Faculdade do Juízo, (1790), (tard. port. e notas de António Marques e Valério Rohden), Lisboa, Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1990; Cf ainda de I. Kant, Crítica da Razão Pura, (1781-1787), (trad. port.), Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1988.
2 A etimologia da palavra Estética remete para o grego Aisthêticos, ou, Aisthesis, que significa simultaneamente sensação e reflexão sobre a sensação.
3 Silvina Rodriges Lopes, A Legitimação em Literatura, Ed. Cosmos, Lisboa, 1994, p. 159.
4 I. Kant, Crítica da Faculdade do Juízo, (1790), (trad. port. e notas de António Marques e Valério Rohden), IN-CM, Lisboa, 1990.
5 I. Kant, Crítica da Razão Pura, (1781-1787).
6 I. Kant, Crítica da Razão Prática, (1788).
7 Cf. I. Kant, Crítica da Faculdade do Juízo, (1790).
8 I. Kant, op. cit., p 38.
9 Cf. F. Schiller, Sobre a educação estética do ser humano numa série de cartas e outros textos, (1795), trad. introdução, comentário e glossário de Teresa Rodrigues Cadete, IN-CM, Lisboa, 1993.
10 Cf. Paul De Man, The Rethoric of Romantism, Columbia University Press, New York, 1984.
11 Cf. F. Schiller, Sobre o Ingénuo e o Sentimental, (1795), informação colhida em Raymond Bayer, História da Estética, (trad. port. de José Saramago), Lisboa, Editorial Estampa, 1993, p. 294.
12 Leonel Ribeiro dos Santos, “Apresentação”, in Educação estética e utopia política, Lisboa, Ed. Colibri, 1996, p.7.
13 Jurgen Habermas, O Discurso Filosófico da Modernidade, (trad. colectiva com rev. cient. de António Marques), Lisboa, Pub. Dom Quixote, 1990, p. 54.
14 Lionello Venturi, História da Crítica da Arte, (trad. port de Rui Eduardo Santana Brito, Lisboa, Edições 70, 1984, p. 169.
15 Jurgen Habermas, op. cit., p. 41.
16 Cf. G. Hegel, Estética, (1835), (trad. port. de Álvaro Ribeiro e Orlando Vitorino, Lisboa, Guimarães Editores, 1993.
17 Cf. G. Hegel, Fenomenologia do Espírito, (trad. mexicana, Fondo de Cultura Económica, 2º ed., 1973).
18 G. Hegel, Estética, p. 44.
19 Silvina Rodriques Lopes, op. cit., p. 194.
20 Cf. Peter Bürger, Teoria da Vanguarda, (trad. port. de Ernesto Sampaio), Lisboa, Vega, 1993.
21 Jurgen Habermas,  Sobre a actualidade de Walter Benjamin, informação colhida Peter Bürger, Teoria da Vanguarda, (trad. port. de Ernesto Sampaio), Lisboa, Vega, 1993,  p. 54.
22 Peter Bürger, op. cit., 57.
23 Ibidem, p. 64.
24 Ibidem, p. 65.
25 Maria Teresa Cruz, “Estética e configuração da experiência”, in Comunicações, 1, Novo Encontro de Filosofia (Estética e Filosofia), Coimbra, Associação de Profressores de Filosofia, 1995, pp. 72-73.
26 Maria Teresa Cruz, “Arte e experiência estética”, in Idalina Conde (org.), Percepção estética e públicos da cultura, Lisboa, Acarte, Fundação Calouste Gulbenkian, 1992.
27 Cf. F. Schiller, Teoria da Tragédia, trad. Flávio Meurer, São Paulo, Ed. E.P.U., 1992.
28 Cf. Boaventura Sousa Santos, “O social e o político na transição pós-moderna”, in AAVV, Revista de Comunicação e Linguagens, nº 6/7, 1988, pp. 26-35. (Análise esta que segue de perto a concepção de Max Weber, e a leitura que dela faz Habermas, acerca das divisões promovidas pelo projecto inicial da modernidade).
29 Peter Bürger, op. cit., p. 89.
30 Ibidem., p. 90
31 Ibidem.
32 Ibidem., p. 91
33 Ibidem.
34 Os «manifestos» são a  forma recorrente de apresentação e declaração pública dos grupos de artistas que fizeram as chamadas «vanguardas históricas». Efectivamente, Marinetti publica o «Primeiro Manifesto do Futurismo», a 20 de Fevereiro de 1909, no jornal francês «Le Figaro». Em 1913, G. Apollinaire publica «Les peintres cubistes»; nesse mesmo ano, Larionov apresenta na Rússia o «Manifesto do Rayonismo». Dois anos depois, em 1915, Malevich revelava o «Manifesto do «Suprematismo». O «Primeiro Manifesto Dada» foi lido em Zurique, na Suiça, em 1918. Nesse ano, Ozenfant e Jeanneret, apresentavam também o «Manifesto do Purismo», assim como surgia igualmente o «Primeiro Manifesto de De Stijl» de Van Doesburg e Piet Mondrian, entre muitos outros que nas primeiras três décadas do século XX anunciavam uma nova arte, desta forma afirmada publicamente.
35 Renato De Fusco, História da Arte Contemporânea, (trad. port. de Maria Jorge Vilarde Figueiredo), Lisboa, Editorial Presença, 1988, p. 297.
36 Cf. Leo Steinberg, Other Criteria: Confrontations with Twentieth Century Art, Oxford, 1972.
37 Cf. Renato Poggioli, The Theory of the Avant-Garde, (1962), (trad. para italiano por Gerald Fitzgerald), Harvard, 1968.
38 Cf. T. Adorno, Teoria Estética, (trad. port. de Artur Morão), Lisboa, Edições 70, 1993.
39 Peter Burger, op., cit., p.51.
40 Ibidem., p. 94.
41 Sobre esta matéria, Cf. Jacques Derrida, La vérité en peinture, Paris, Flamarion, 1978; e Cf. Thierry de Duve, Nominalisme Pictural. Marcel Duchamp, la Peinture et la Modernité, Paris, Ed. Minuit, 1984.
42 Ibidem.
43 Maria Teresa Cruz, Designação dos Limites: o Trabalho do Nome na Constituição da Obra Moderna, (texto policopiado) tese de Mestrado em Comunicação Social, FCSH-UNL, 1989, p. 117.
44 Ibidem., p. 118.
45 Cf. Maria Teresa Cruz, op. cit.
46 Maria Tersa Cruz, op. cit., p. 153.
47 Cf. Charles Baudelaire, O pintor da vida moderna, (trad. port. e posfácio de Teresa Cruz, Lisboa, Vega, 1993.
48 Cf. Harold Rosenberg, The tradition of the new, Horizon, 1959.
49 Thierry de Duve, op. cit., p. 165.
50 Cf.  Walter Benjamin, Sobre Arte, Técnica, Linguagem e Política, Lisboa, Relógio d’Água, 1992, pp. 70-113.
51 Maria Teresa Cruz, op., cit., p. 117.
52 Ibidem., p. 146.
53 Cf. Rosalind Krauss, The originality of the avant-garde and other modernist myths, Cambridge/Massachusetts, MIT Press, Cambridge, 1986.
54 Rosalind Krauss, op. cit., p. 171.
55 Marcel Duchamp, Engenheiro do Tempo Perdido. Entrevistas com Pierre Cabanne, Lisboa, Assírio e Alvim, 1990,  p. 70.
56 Cf. Luc Ferry, Homo Aestheticus, Paris, Ed. Grasset, 1991, pp. 209-262.
57 Rosalind Krauss, op. cit., p. 171.
58 Cf. Thomas More, A Utopia, [De optimo reipublicae status deque nova insula utopia], (1516), (trad. port. de José Marinho),  10ª Edição,  Lisboa, Guimarães Editores, 1996.
59 Sobre este tema cf. Jean Servier, L’utopie, Col. “Que sais-je”, Paris, Press Universitaires de France, 1979.
60 Cf. F. Engels e K. Marx, Utopisme e communauté de l’avenir, (trad. francesa), Paris, Petite collection Maspero, 1976.
61 Max Horkheimer, Eclipse da Razão, 1947.
62 Max Horkhiemer e Theodor Adorno, Dialéctica do Iuminismo, (p. 57). Informação colhida em Hürgen Habermas, O Discurso da Modernidade, pp. 127-128.
63 Sobre estes contéudos, cf. Max Horkheimer, Para uma crítica da razão instrumental, 1967, ou Teoria crítica, 1969, e de Theodor W. Adorno, Minima moralia, 1951.
64 Gianni Vattimo, A Sociedade Transparente, (trad. port. de de Hossein Shooja e Isabel Santos), Lisboa, Relógio D’Água, 1992, p. 68.
65 John Dewey, A Arte como Experiência, 1934.
66 Designação inspirada no “Manifesto do Surrealismo” proclamado em 1924 por André Breton.
67 Herbert Marcuse, O Homem Unidimensional, (1964), p. 238. Informação collhida em Nicola Abbagnano, História da Filosofia, vol. XIV, Lisboa, Ed. Presença, p. 240.
68 Cf. José Jimenez, La estética como utopía antropológica, Bloch e Marcuse, Madrid, Ed. Tecnos, 1983.
69 Ibidem., p. 239.
70 Simón Marchán Fiz, Del arte objectual al arte de concepto, Madrid, Ed. Akal, 1994.
71 Nicola Abbagnano, Nomes e Temas da Filosofia Contemporânea, (trad. Miguel Serras Pereira), Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1990, p. 121.
72 Ibidem., p. 122.
73 Cf. Maria Teresa Cruz, “Experiência estética e estetização da experiência” , in AAVV, Revista de Comunicação e Linguagem, nº 12/13, 1991, pp. 57-65.
74 Cf. Simón Marchán Fiz, op., cit.